quarta-feira, 21 de março de 2012

Ares Serranos - Parte III

A rivalidade entre pessoas, entre grupos, entre localidades, entre regiões, entre países, deve ser tão velha como o homem. Obviamente que quando se trata de uma demanda visando somente o poder, realmente os resultados podem ser catastróficos. Aliás, muitas guerras começam com rivalidades regionais. Todavia, não é dessas rivalidades que agora importa realçar. Efectivamente, refiro-me às rivalidades saudáveis que visam o desenvolvimento em qualquer dos seus aspectos, por vezes os intervenientes podem até fazê-lo de forma inconsciente, mas, no fundo, o resultado, em termos sociais e humanos é que seja óptimo. Este tema vem a talhe de foice, porque, desde o surgimento do Gerês como localidade com população fixa, desenrolou-se, umas vezes mais outras menos, pequenas rivalidades entre as populações do Gerês e do Vilar da Veiga que, a meu ver, contribuíram para o desenvolvimento social da região geresiana. Embora a minha opinião seja muita subjectiva, estou em crer que o facto que, de seguida, vou relatar terá sido um dos embriões da rivalidade saudável existente entre o Gerês e o Vilar da Veiga.“Em princípios de Setembro do último anno (1885) andando 4 homens a escavar um grande penedo que estava em uma horta junto d´esta povoação, o penedo deslocou-se e matou quasi instantaneamente um dos dictos homens.
A autoridade local (um simples cabo de policia) officiou logo o regedor de Villar da Veiga, distante mais de 5 kilometros, para que desse as providencias necessárias. O regedor participou o caso ao juiz ordinário e este deu ordem para que se levantasse o cadáver e fizessem o enterro como podessem ou quizessem, visto não haver suspeitas de crime. O regedor transmitiu a ordem ao seu cabo, mas não se incommodou a subir a montanha nem se importou com a guarda do enterramento do cadáver. O caso não será simples, porque desde 24 de Junho até 29 de Setembro não pode o parocho de Villar da Veiga exercer aqui acto algum do seu ministério sem consentimento do capellão das Caldas e, quando morre algum parochiano, vai o capelão acompanhar o cadaver até à extremidade d´esta aldeia e ali o entrega ao parocho para este fazer conduzir à egreja parochial, em forma dos privilégios supra, concedidos por el-rei D. João V e que foram confirmados ainda há poucos annos, por causa de certa pendência entre o capellão e o parocho; mas o capellão só dentro d´esta aldeia pode exercer actos parochiaes.
Pediu-se ao capellão que removesse o cadáver para a casa do falecido ou para qualquer outra para se fazer o enterro, mas o capellão não consentiu, por estar fora do limite d`esta aldeia. Por seu turno o parocho e o regedor só no dia seguinte compareceram, e assim esteve o cadáver dois dias e duas noites no campo, exposto à intempérie, com grave risco da saúde publica.”
Como se pode constatar já em 1885, existia “certa pendência” entre o Pároco do Vilar da Veiga e o Capelão do Gerês, embora este último apenas exercesse o poder canónico entre 24 de Junho e 29 de Setembro. Consequentemente, é lógico supor que esta controvérsia também transvazasse para as populações e se tenha arrastado por muitos anos. Porém, o importante é que essa rivalidade se transforme em progresso social e humano que, na minha modesta opinião, foi o que brotou das rivalidades entre geresianos e vilarenses. Aliás, como já referi a minha família paterna é oriunda do Geres, já a minha família materna é originária do Vilar da Veiga, quando o meu pai começou a namoriscar a minha mãe, tal namoro não foi aceite de imediato pelo meu avô materno, sendo certo que um dos defeitos que este apontou ao meu pai, era ser natural do Gerês. Contudo, mas passado esse embate, esses meus familiares não só fortaleceram os laços familiares como viveram uma grande amizade. Acho que o clima é mesmo esse, podem existir algumas rivalidades, mas quando necessário, puxam todos – Geres e Vilar da Veiga - para o mesmo lado.
Bibliografia: -“Diccionario – Geografhico, Estatístico, Chorographico, Heraldico, Archeologico, Historico, Biographico e Etymologico.” De Augusto Soares d´Azevedo Barbosa de Pinho Leal. Livraria Editora Tavares Cardoso & Irmão, Largo do Camões, 5 e 6, Lisboa.
Fonte: Facebook (Luís Guimarães), em 21-03-2012

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