segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Cafés e esplanadas cheios... de gente poupada

É indesmentível: os portugueses estão mais criteriosos, cautelosos e seletivos no consumo. O que os comerciantes da região talvez não esperavam é que também os emigrantes chegassem com a necessidade da mesma determinação. Resultado: os cafés e esplanadas estão, neste verão, cheios... de gente poupada.
A culpa, desta vez, nem morre solteira. Por outro lado, volta a ser atribuída à inimiga de sempre: a crise. A longa, resistente e, cada vez mais grave, crise!
 Salvam-se, ao que parece, os comerciantes do Gerês que, sem o fantasma dos incêndios para atrapalhar, têm registado bons volumes de negócio às custas de emigrantes e novos visitantes que preferem despender o seu dinheiro na região.
No caso destes até poderá ser necessário sublinhar também a importância da chegada de milhares de romeiros que acorrem a S. Bento, nesta altura do ano, e que vão consumindo nos diversos estabelecimentos comerciais locais. O mesmo já não se pode dizer dos dividendos colhidos pelos negócios instalados junto à estrada nacional Braga-Gerês.
Noutra perspetiva, os bares situados juntos às praias fluviais e zonas de lazer do Vale do Homem reconhecem o aumento do fluxo de turistas nestas zonas, evitando as dispendiosas viagens até à praia, mas queixam-se dos consumos quase nulos da larga maioria.
De acordo com Paulo Azevedo, gerente de dois estabelecimentos comerciais situados em zonas de lazer na margem do rio Cávado – um em Lago, Amares, outro na Vila de Prado, em Vila Verde –,“há, sem qualquer margem para dúvida, um decréscimo no regresso dos emigrantes portugueses, neste verão”.
“Há quem prometa uma nova remessa na segunda quinzena de agosto, mas estou desconfiado que vamos continuar a sentir a quebra. Isto, por si só, já trouxe malefícios ao negócio”, desconfia.
Paulo Azevedo esclarece que, por outro lado, “o público forte das zonas de lazer da região é um público mais jovem”. “Ora, o que se nota é que essa nova geração tem, agora, menos direitos laborais que os seus progenitores. Como tal, vêm menos tempo que os pais, logo ficam um menor período de tempo a consumir em Portugal”, explicou o responsável pelo Autocarro Bar, da Ponte do Bico, em Lago.
Como se não bastasse o reduzido número de emigrantes na região, comparativamente com anos anteriores, neste verão “estão mais criteriosos, mais cautelosos e escolhem bem os sítios onde hão de gastar dinheiro”. “Por exemplo, acredito que aqueles cafés de aldeia estejam a sentir muito esse efeito. Nota-se que se poupam nesses espaços para gastar nos sítios que escolhem para se divertir”, adivinha.
Mas nem tudo são más notícias. A crise obriga à alteração de vários hábitos. Uma dessas mudanças trouxe mais gente para as zonas de lazer, em detrimento das idas para as praias da costa portuguesa. Pena que isso não se traduza em maior consumo.
“Este ano, optam por ficar mais pela região. Quer os portugueses que cá vivem, quer os emigrantes. É mais barato que irem para a praia. Além disso, o tempo está algo incerto, as nortadas são frequentes. Podemos ainda acrescentar o facto de as portagens estarem mais caras, logo acabamos 'beneficiados' por todos estes condicionalismos. O problema é que são aos milhares os que vêm, se sentam na toalha e não consomem nada a tarde inteira”, lamenta.
Portugueses que vivem na região vão menos à praia
Enquanto pessoas que vivem ou trabalham no Vale do Homem durante todo o ano, os residentes desta região costumam escolher o período do verão para dar uma escapadela até outro país ou, no mínimo, até à praia, onde permaneciam algumas semanas. No entanto, também este cenário conheceu alguma transformação.
“Enquanto, nos anos passados, eram os emigrantes que permaneciam mais por cá e os portugueses que vivem na região iam preferencialmente até à praia, agora as zonas de lazer estão com uma taxa de ocupação mais equilibrada entre uns e outros”, revela Paulo Azevedo, jovem comerciante responsável pelo bar ‘Pé Descalço’, da zona do Faial em Prado.
“As nossas famílias, que vivem na região, já só vão três ou quatro dias à praia e regressam de imediato para ver se poupam algum”, explica.
Porém, à diminuição do regresso dos emigrantes, veio juntar-se um hábito popular cada vez mais vincado de se ocuparem as praias fluviais, mas não as esplanadas. “Ou seja, vê-se mais gente junto à água, mas regista-se uma quebra drástica no consumo”, garante Paulo Azevedo.
Nem os romeiros de S. Bento ‘salvam’ cafés com consumo extra
Em Amares, José Maia, responsável do Café/Pastelaria Universal, de Bouro Santa Maria, falava em “emigrantes que consomem mais de dia, mas que ficam por casa, à noite”. “Este ano, parece-me haver menos emigrantes na rua que nos anos anteriores. Em contrapartida chamam mais a atenção, dão mais nas vistas”, acrescentou o comerciante, referindo que “as manhãs de negócio têm sido melhores que nos anos anteriores”. “No entanto, as tardes continuam em declínio e as noites quase nem existem. Para as noites, preferem comprar algo nas grandes superfícies comerciais e ficar por casa”, avaliou José Maia, reconhecendo que, no geral, “a melhoria das manhãs acaba por compensar”.
Contudo, por outro lado, há em 2012 um movimento claramente em retrocesso, face aos anos anteriores, e que diz respeito à passagem de romeiros rumo a S. Bento. De acordo com o comerciante, são menos os romeiros que se vêm na estrada e consomem pouco. “Vêm abastecidos e evitam gastar no café. No entanto, só terça-feira, dia que antecede o feriado é que se poderá traçar o balanço final”, explicou.
 Gerês com enchentes durante o dia e deserto à noite
Ao cenário menos positivo que afeta praticamente todo o Vale do Homem, parece estar a escapar, este ano, o Gerês. Sem incêndios a perturbar os negócios, Pedro Pereira, responsável do restaurante ‘O Chana’, considera até que “este ano há mais emigrantes”. “Pelo menos, nesta zona, é a ideia que me dá. Comparativamente com o ano passado, não tenho dúvidas. Foi um ano muito fraco, o transato. Para além de haver mais emigrantes houve uma melhoria das receitas. Enquanto no ano passado, as famílias chegavam cá e pediam duas doses para quatro pessoas, agora pedem doses por pessoa. Se é um grupo de 15 clientes, pedem 15 pratos diferentes”, reconheceu, defendendo que, “no global, no Gerês as coisas estão melhores este ano”.
Por outro lado, os portugueses de cá, os que cá vivem “estão nitidamente mais poupados, fazem mais contas antes de gastar”. “Nos mais novos, então, isso é notório. Estão bem mais criteriosos”, acrescenta.
Também quanto ao período do dia em que gastam o seu dinheiro, os turistas estão mais focados. “À noite não se vê movimento nenhum. O Gerês fica deserto. Creio que as pessoas evitam sair para gastar dinheiro nesse período, porque já sabem que se bebem dois ou três whiskys gastam o dinheiro de um dia inteiro de diversão”, sustentou.
‘Ajuda’ dos emigrantes é sempre bem vinda
Quem não tem dúvida da importância da chegada dos emigrantes à região, mesmo que apenas por um mês, é António Gama, responsável pela exploração do ‘Bar da Malheira’, junto à zona de lazer de Sabariz. Segundo este comerciante, “a chegada dos emigrantes ajuda bastante o negócio, sem dúvida”. “No entanto, se o tempo não estiver bom, as pessoas não vêm até cá. Pelo contrário, se estiver calor, as pessoas acabam sempre por consumir. Por isso, creio que o estado do tempo é o mais importante nestas questões”, defendeu, reconhecendo que qualquer balanço positivo que se possa tratar tenha sempre que se enquadrar no cenário negro que se tem vivido nos últimos meses ou anos. “Claro que a crise afeta sempre e, nos últimos tempos, o negócio tem estado péssimo. No entanto, agora é tempo de aproveitar a vinda dos emigrantes e, no final, se fará o balanço”, explicou António Gama.
Fonte: Terras do Homem, em 20-08-2012

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