sexta-feira, 19 de julho de 2013

Chorense - José Silva: "Temos uma história gastronómica muito rica e uma cultura enraizada de comer bem"

É mais um exemplo que ajuda a comprovar a tendência natural dos terrabourenses para a gastronomia e para o empreendedorismo hoteleiro. Em Sabariz, José Silva criou, há oito anos, a Quinta da Praia Verde, um espaço de restauração especializado na promoção de serviços e eventos como casamentos, batizados, comunhões, almoços e jantares de grupo, entre outros. A gastronomia é, em parte, dominada pela tradição minhota e nacional, não faltando o bacalhau. Em termos de carnes, a escolha recai mais sobre os "grelhados de qualidade", sempre confecionados na hora, por maior que seja o serviço. Outros pratos podem, no entanto, ser confecionados à medida do cliente. Tem ainda serviço de catering para serviços fora da Quinta.
José Silva começou cedo a sua aventura pelo mundo da hotelaria. Tal como muitos jovens terrabourenses da sua geração, este empresário natural de Chorense cedo saiu de Terras de Bouro à procura de uma vida melhor, num setor onde já existia alguma tradição de sucesso por parte dos seus conterrâneos. Começou em Vila do Conde, depois continuou no Porto. Daí, seguiu para Aveiro, antes de regressar ao Porto. "Em termos internacionais, cheguei a trabalhar na Holanda, antes de regressar e de me instalar na Póvoa do Varzim. Mais tarde, surge então a Quinta da Praia Verde, há cerca de oito anos", contextualiza.
José Silva nasceu a 18 de julho de 1971, em Terras de Bouro, onde ainda vive, é casado e tem dois filhos. Numa época em que o ensino não era prioridade nos meios rurais, estudou até ao 2º ano da telescola local. Depois, teve que abraçar o trabalho para se fazer homem e seguir o seu próprio caminho.
Depois de algumas décadas de experiência a trabalhar por conta de outrem, José Silva foi desafiado por um cliente seu a arriscar criar o seu próprio negócio, tendo-lhe até sido proposto o local ideal. A Quinta da Praia Verde, situada na freguesia de Sabariz, junto à margem do rio Homem e próxima da praia da Malheira. "Fui fazer um serviço de final de ano a um senhor que era proprietário desta quinta e este disse-me que estaria na disposição de alugar ou até mesmo vender o espaço, se eu quisesse aqui instalar o meu negócio. Estudei a proposta e aceitei o desafio. Desde então, ampliámos o espaço e demos-lhe alguns toques de modernidade", recordou José Silva, que já trabalha em hotelaria há cerca de 35 anos.
Começou como ajudante de cozinha, uma das "saídas profissionais mais em voga naquele tempo", para quem queria sair da aldeia e fugir à dureza dos trabalhos do campo e da lavoura.
Ao longo do seu percurso profissional, já serviu personalidades como o atual Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, ou a maior fadista portuguesa da história, Amália Rodrigues.
Não traça outro objetivo futuro que não seja a "inovação e melhoria constante dos serviços", de forma a manter o volume de trabalho que tem atualmente. "Essa inovação e aumento de qualidade é o que nos tem projetado, desde sempre", afirma.
"Uma quinta tem que ter algo que a distinga"
Ao fim de oito anos, José Silva considera que a aposta de criar a Quinta da Praia Verde foi acertada, apesar do risco inicial. "É sempre um risco comprarmos um espaço destas dimensões para criar um negócio. Mas, felizmente, deu certo. Eu também estava mais ao menos seguro, porque era da área e tinha noção do potencial que existia aqui. A estrutura e a beleza natural envolvente davam-me essas garantias", explica. Num serviço de verão, afirma José Silva, "é frequente o cliente procurar a frescura e uma zona próxima de um rio ou de um curso de água".
No fundo, para a hotelaria, "uma quinta tem que ter algo que a distinga das demais". "As pessoas não escolhem fazer um serviço num determinado local apenas pela gastronomia, mas também pelas condições físicas do espaço e pela envolvente natural", entende este empresário terrabourense.
Terrabourense vira-se para a cozinha para fugir à vida dura do campo
Sou daquela geração de muitos terrabourenses que se lançaram país e mundo fora à procura de melhores condições de vida, numa área em que nos fomos especializando cada vez mais, a hotelaria e restauração. Fazíamo-lo para fugir à vida dura do campo.
"Além disso, antigamente, não se via pessoas da cidade a cozinhar. Pessoas de famílias abastadas não reconheciam dignidade nesta profissão, pelo que os melhores cozinheiros vinham das aldeias. Hoje em dia já não é assim, a carreira de chefe de cozinha é bem reconhecida, exige enorme formação escolar e profissional e já recebe gente de todos os extratos sociais", avalia.
No entanto, a mudança da lavoura para a hotelaria traz também, nos primeiros tempos, alguns dissabores para quem começa a trabalhar neste setor. "A princípio também não é fácil mentalizarmo-nos que queremos fazer disto a nossa vida. Ninguém gosta dos primeiros tempos na restauração, porque tem que se habituar ao facto de passar os fins de semana a trabalhar, enquanto outros se divertem. Enquanto somos solteiros, principalmente, é difícil aceitar essa condição. Mas, depois, lá nos habituamos e, anos mais tarde é tão natural folgar à segunda ou terça-feira, como ao sábado ou domingo", explica.

"Aumento do IVA foi fatal para muitas empresas"
Terras do Homem: Quais são as grandes dificuldades que afetam um empresário desta área, na atualidade?
José Silva: A maior dificuldade de todas é não sabermos aquilo que nos espera. Não sabermos o que irá acontecer no dia de amanhã, perante a conjuntura económica atual. Como se não bastasse vermos que os impostos nos levam grande parte do fruto do nosso trabalho, ainda temos que ficar com um pé atrás, tendo em conta as crescentes dificuldades com que vive a maioria das famílias da nossa região. Com a diminuição do poder económico, as pessoas organizam menos eventos de grupo.
A isto juntam-se elevados custos com energia elétrica, gás ou água. Felizmente, até agora, temos trabalhado bem e contornado as dificuldades. Vamo-nos tentar manter nesta linha.
Este tipo de governação não olha, em momento algum, para os nossos problemas nem para a importância deste setor.
Às vezes é preciso fazer-se verdadeiros milagres para se continuar a trabalhar e a apresentar preços competitivos. O cliente não se pode esquecer que esta é uma profissão muito desgastante.
TH: A subida do IVA de 13 para 23% foi fatal para a restauração?
JS: Na maior parte dos casos foi. Faliram muitas empresas, eliminaram-se milhares de postos de trabalho. A subida do IVA obrigou a aumentar preços, a diminuir margens de lucro e a perder clientes. Ora, tudo isto somado resultou num forte revés para o setor.
É um setor com enorme potencialidade, mas que é constantemente muito sacrificado.
TH: E do outro lado, quais são as vantagens que retira do exercício desta profissão? O que o faz permanecer em atividade neste setor?
JS: Antes de mais, a nossa própria realização pessoal. Gosto muito do que faço e é importante sermos bem sucedidos na área que escolhemos para fazer vida. Se tivermos uma boa imagem junto das pessoas, sentimo-nos mais realizados e melhores connosco próprios. Se reconhecerem o nosso trabalho, temos aquele sentimento de dever cumprido.
Mas, claro, também há aqueles momentos menos bons em que temos vontade de desistir.
TH: Como enfrenta este verão, ao nível da "agenda"?
JS: Apesar da crise que se vai sentindo e agudizando no país, no caso da Quinta da Praia verde, o verão até tem uma agenda bem preenchida. Apesar da crise, temos ainda bastante trabalho para fazer. Se se mantiver assim, já não é mau. Como disse, o nosso maior medo é o dia de amanhã.
TH: Qual a principal característica que deverá ter um gerente hoteleiro, na nossa região, para ser bem sucedido?
JS: Tem que ser, acima de tudo, um inovador e, simultaneamente, primar sempre pela qualidade do serviço que presta.
Temos uma cultura muito forte ligada ao comer bem, temos uma história gastronómica muito rica e isso obriga-nos, a nós, cozinheiros a apresentar, simultaneamente, os pratos mais simples e as ementas mais elaboradas, porque o cliente português assim o exige. A nossa cozinha, ao contrário de muitos países, é uma cozinha por regiões, muito diversificada.

Gostos e preferências
Onde reside?
Em Terras de Bouro.
Profissão?
Gestor hoteleiro e chefe de cozinha.
Últimas férias que fez?
Foram na Madeira.
Último passatempo que desenvolveu?
Ver futebol com os amigos. Já joguei, em tempos, mas depois tive que parar.
Carro que usa?
Um BMW.
Almoço de hoje?
Carapau com batata cozida e feijão verde.
Bebida de hoje?
Vinho maduro tinto.
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Onde gostaria de morar?
Gosto muito de onde eu moro.
Profissão que gostaria de ter?
Se não trabalhasse nesta área, talvez fosse motorista de longo curso.
Férias preferidas?
Talvez Nova Iorque.
Passatempo preferido?
Fazer piscina.
Carro que gostaria de ter?
É-me suficiente o que tenho.
Prato preferido?
Bacalhau assado na brasa.
Bebida preferida?
Vinho maduro tinto.
Fonte: Terras do Homem, em 19-07-2013

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